Precisamos falar de suicídio

01/09/2017

Por Bob Vieira da Costa*

Publicado na Folha de S. Paulo

A cada 40 segundos uma pessoa se mata. São quase 800 mil vítimas por ano no mundo. Para cada caso, há pelo menos outras 20 tentativas.

Ou seja, quase 20 milhões de pessoas podem não conseguir se matar, mas tentam. Mais: de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 90% dos suicídios poderiam ser evitados.

Pouco se fala sobre o tema. Há tabus que impedem que seja discutido e, assim, enfrentado tanto do ponto de vista social quanto individual.

No Brasil, 32 pessoas tiram a própria vida por dia, uma a cada 45 minutos, o que faz de nós o oitavo país com mais suicídios no planeta.

Em uma sala com 30 pessoas, é provável que cinco delas já tenham pensado nisso. Os dados são do Centro de Valorização da Vida (CVV).

Esse panorama tem se tornado mais grave nos últimos anos. Se em alguns dos países com maior incidência de suicídio a taxa está estável, por aqui ela tem crescido.

Segundo o Mapa da Violência, entre 2002 e 2012, o total passou de 7.726 para 10.321, um aumento de 33,6%, o triplo da taxa de crescimento da população, que ficou em 11,1%. São 5,3 casos para cada 100 mil habitantes. O índice fica acima do de outras formas de mortes violentas no mesmo período, como homicídios (2,1%) e acidentes de trânsito (24,5%).

Ainda nos dias de hoje existe a ideia, muito difundida em nossa sociedade, de que o suicídio seria, de certa maneira, “contagioso”. Por essa lógica, falar ou dar audiência para o tema seria uma influência negativa. Mas, sem estudar caso a caso, é difícil estabelecer essa relação.

O sociólogo francês Émile Durkheim, que baseou boa parte de seus estudos a essa questão, considerando-a uma patologia social, não acreditava que a sugestão fosse relevante. Para ele, essas mortes já estariam fadadas a ocorrer, e qualquer influência externa poderia apenas acelerá-las.

Por essa análise, a pessoa influenciada por uma obra ou notícia já teria potencial para comportamento suicida. Deixar de falar sobre o assunto não resolveria o problema.

Por acreditar que a melhor maneira de alterar esse cenário se dá com diálogo aberto, o Comunica Que Muda resolveu ir fundo no tema. Mergulhamos nas redes sociais para saber o que e como as pessoas falam do suicídio.

Nos meses de abril e maio de 2017, foram capturadas 1.230.197 de menções sobre o tema nas redes sociais. Explica-se esse alto número pelo fato de que, no mesmo período, o tema passou a ser discutido em razão do crime virtual Baleia Azul e da estreia da série “13 Reasons Why”.

Observamos que a abordagem a respeito do suicídio ainda é muito superficial. De um lado, menos de 30% dos internautas que comentaram o assunto demonstraram alguma conscientização; de outro, quase 20% do conteúdo das redes é de mensagens preconceituosas, que reforçam o tabu, incentivam o comportamento autodestrutivo ou impedem o socorro de quem passa por esse problema.

Ninguém é culpado por um suicídio. Ele não é previsível, mas pode ser prevenido.

O tema tem sido tabu por um longo tempo, e as taxas continuam crescendo. Não tratar um problema não faz com que ele desapareça. Ao contrário, apenas permite que cresça no escuro. Por isso, precisamos derrubar esse tabu.

E falar, sim, abertamente sobre o suicídio.

*BOB VIEIRA DA COSTA é sócio-fundador da agência de propaganda nova/sb. Foi coordenador de comunicação do Ministério da Saúde e ministro-chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência da República (governo FHC)