Bike contra a guerra

14/07/2017

Clube de ciclismo em Goma, no Congo, dá esperança a região marcada por guerras

POR ERIKA SALLUM
Publicado no blog Ciclocosmo da Folha de S. Paulo

Uma incrível, porém silenciosa revolução está acontecendo na África, em países tão diversos quanto Congo, Eritreia, Ruanda e Etiópia. Essa revolução chega pedalando, liderada por atletas e gente comum apaixonados por bicicletas e que enfrentam bem mais que duras montanhas ou horas de treino sob sol escaldante. Contra a pobreza, o preconceito e a falta de grana e de infraestrutura, a bike surge como ferramenta importantíssima no processo de restauração da autoestima e da esperança de todo um continente.

Um exemplo extraordinário é o Goma Cycling Club, um clube de ciclismo criado há cerca de dois anos no turbulentíssimo leste da República Democrática do Congo (RDC). Localizada às margens do lago Kivu, a cidade de Goma sempre esteve envolvida nas guerras recentes que assolaram o país e seus vizinhos, como Ruanda.

Não há estrada esburacada ou bike ruim que impeça esses congoleses de pedalar (Foto: Reprodução/Goma Cycling Club)

Os muitos conflitos no Congo — um deles conhecido como a Guerra Mundial Africana, entre 1998 e 2003 — já causaram a morte de mais de 6 milhões de pessoas. Trata-se de uma região das mais frágeis do continente, onde doenças, pobreza extrema e rivalidades étnicas ainda marcam o dia a dia da população.

Introduzida por colonizadores belga, a bike por décadas era “coisa de brancos”, mas essa história enfim começou a mudar.

Quem disse que é preciso bike “top” e roupas caras para pedalar? (Foto: Reprodução/Goma Cycling Club)
Provavelmente a camiseta mais “cool” entre os clubes de ciclismo por aí (Foto: Reprodução/Goma Cycling Club)

Por tudo isso, o Goma Cycling Club é muito, mas muito mais que apenas um grupo de amigos que adora pedalar. No vídeo a seguir, Charles Guy Makongo, presidente do clube, vai direto ao ponto: “Goma é conhecida por guerras e catástrofes. O que queremos com o ciclismo aqui é construir uma nova realidade”. No início, eles viviam escutando que “estradas e ruas foram feitas para os carros”. Mesmo assim, com apenas algumas bicicletas de qualidade para pedalar (e muitos modelos “pau para toda obra”), seguiram em frente. Nas raras e novas estradas asfaltadas (até pouco tempo atrás não havia rua pavimentada por lá), os ciclistas foram abrindo seu espaço e fazendo os motoristas entender que era preciso dividir a via e respeitar a bike. “Nós temos problemas com estradas, com segurança, com equipamentos, com falta de roupas adequadas para pedalar. Mas somos otimista e acreditamos que por meio do nosso trabalho nós vamos mudar Goma.” Já estão mudando.

O Olympic Channel lançou neste ano uma série de vídeos muito bem feitos, batizada de Africa Cycling Revolution, mostrando como a bike tem mudado o cotidiano de muitos africanos. Este aqui, belíssimo, traz o Congo e o Goma Cycling Club como tema — não deixe de assistir (tem legendas em português).

Este vídeo, “caseiro” e falado em francês, mostra um pouco mais da “vibe” da galera e da paixão dos integrantes do Goma Cycling Club pelo ciclismo e sua força transformadora: